24 de julho de 2014

A LGDH CONSIDERA PREMATURA A ENTRADA DA GUINÉ EQUATORIAL NA CPLP

A Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), da Guiné-Bissau considerou hoje "prematura" a adesão da Guiné Equatorial à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), hoje aprovada na cimeira de chefes de Estado e de Governo, em Díli.
"Achamos que a adesão da Guiné-Equatorial à CPLP é prematura, era preciso aguardar mais tempo para vermos se efetivamente está a cumprir com algumas exigências da CPLP", disse hoje à Lusa, Augusto Mário, dirigente da LGDH.
A CPLP havia exigido uma moratória à pena de morte mas a Guiné Equatorial fez publicar somente uma resolução presidencial que suspende, temporariamente, a pena capital, sem qualquer compromisso e mantendo a medida no Código de Processo Penal do país.
Por isso, "é preciso de facto fiscalizar a aplicação" dessa suspensão, bem como o respeito "pelo direito à manifestação, reuniões públicas e pelo exercício de outros direitos civis e políticos", acrescentou.
Augusto Mário lamenta a situação em que "a CPLP colocou os direitos humanos numa segunda posição: não devia ser assim. A Guiné-Equatorial ainda tem trabalho de casa por concluir".

21 de julho de 2014

GUINÉ-BISSAU: A ÚLTIMA OPORTUNIDADE



Um novo poder apoiado pela comunidade internacional será capaz de lidar com maior pragmatismo e, sobretudo, incutir confiança.

É muito frequente considerar-se a Guiné-Bissau um Estado falhado, à deriva, dominado pelo crime organizado.

Todos os indicadores o demonstram na última década. Está muito próximo desse “estatuto”. Não há presença da Administração estatal eficaz em praticamente nenhum sector da vida nacional. Existem serviços quase todos eles dominados por uma corrupção generalizada e ostensiva, que salta à vista de toda a gente. O Estado não consegue cobrar impostos. As actividades económicas desenrolam-se num autêntico maná de economias paralela, sem taxação, sem controlo de segurança e qualidade.

Alguns destes sectores alimentam-se do caos. Há uma transversalidade do caos.
A Guiné-Bissau foi engolida por problemas de crime organizado, tráfico de drogas, tráfico de seres humanos, o desmatamento, a pesca ilegal, que esgotou os seus recursos naturais. O Porto de Bissau está cheio de contentores carregados de madeiras preciosas que sem destinatários oficiais... alguns governadores provinciais (reconhecidamente corajosos…), denunciam todos os dias estas situações nas páginas dos jornais. Mas não há polícia, guarda-fiscal, exercito, com vontade de parar estes desmandos. Tudo na mais absoluta impunidade. Os tribunais não funcionam, o Ministério Publico tem centenas de processos, sobre crimes graves, incluindo espancamentos de políticos, que estão fechados na gaveta e provavelmente nunca verão a luz do dia.

Há uma sensação de impunidade sobre os militares, umas forças armadas descontroladas, mal alimentadas, mal pagas, sem dinheiro para uniformes, para equipamentos. Ao mesmo tempo há um generalato e almirantado completamente inúteis, desproporcionado em número, que exibe orgulhosamente galões e estrelas brilhantes, e com um poder avassalador. Gente muito “sensível” e orgulhosa.

Desde a guerra civil de 7 de Junho de 1998, que a Guiné Bissau conheceu vários golpes de Estado sangrentos, intentonas, assassinatos consumados de chefes militares, de um Presidente Eleito, tentativa de assassinato de um Primeiro-Ministro no golpe de Abril de 2012.

Nas eleições gerais de Abril e Maio, os eleitores mostraram um cartão vermelho a estes ditadores: querem mudar e querem fazer parte dessa mudança. A grande afluência às urnas em todo o País foi a confirmação de que os guineenses, nas cidades, nas tabancas, na diáspora, querem ser parte de uma transformação radical do actual “status quo”. Os comícios de campanha eleitoral foram marcados pelo civismo. Deve haver poucos lugares no mundo, onde os dois candidatos rivais escolhem para fecho de uma campanha na segunda volta das presidenciais, a mesma praça central de Bissau, em festa, sem discursos inflamados, com os dois campos de apoiantes a trocarem abraços, cumprimentos, entre si.


Fui testemunha privilegiada disso em serviço de reportagem, nos contactos pessoais.
E verifica-se que a generalidade dos guineenses sabe bem que escolhas há a fazer, neste regresso à Ordem Constitucional e no elenco de prioridades, que se podiam encaixar num autêntico programa de emergência nacional.

Não há medicamentos nem alimentos para os doentes internados nos hospitais, o abastecimento de energia electrica é caótico, a capital, Bissau, está quase toda às escuras, não obstante os seus residentes pagarem para ter “saldo”, um pré-carregamento de electricidade. Prolifera a poluição do ar por todo o lado, já que a alternativa à electricidade da rede pública, são os milhares de geradores a gasóleo, que não chegam à maioria dos residentes, mas são o motor do funcionamento de estabelecimentos comerciais, hotéis, edifícios públicos, etc.

Tudo isto encarece a prestação de serviços e bens essenciais.
Bissau é uma cidade cara, alguém me dizia que em “certa medida não anda muito longe do Dubai…”

Os produtores de fruta, deslocam-se do interior para os centros urbanos, para comercializarem os seus produtos, e no tajecto são “portajados” várias vezes por supostos fiscais, tornando a vida insuportável a muitos deles, e tudo inflacionando.

 O abastecimento de água é igualmente muito irregular, obrigando muitos guineenses a percorrerem longas distâncias com bidões às costas, para poderem cozinhar e matar a sede. As condições higio-sanitárias são preocupantes, não há recolha de lixo, a alternativa são as queimadas um pouco por toda a cidade. Os esgotos a céu aberto são um autêntico viveiro de mosquitos e de muitas outras coisas insalubres, num país com um clima tropical quente e húmido, onde seres humanos, em especial as crianças e animais, “partilham” uma água pestilenta, perigosa, indutora de doenças como a cólera e a malaria.

Por Luís Nascimento
In Público


1 de julho de 2014

ESTADO DOS DIREITOS HUMANOS

Numa altura em que todos se regozijam pelo retorno à ordem constitucional depois de mais de 2 anos de desgovernação e de afronta aos mais elementares normas que regem o estado de direito, a nossa consciência nos interpela para uma reflexão sobre um assunto de capital importância chamado direitos humanos.

Como é do conhecimento público, a problemática dos direitos humanos nunca fez parte da agenda dos sucessivos inquilinos do poder na Guiné-Bissau desde a independência até a presente data. Tanto assim, as violações sistemáticas dos direitos humanos traduzidas em varias formas, desde assassinatos políticos, espancamentos brutais, detenções arbitrárias, torturas entre outras, foram e continuam a fazer parte do modus operandi de varias estruturas e agentes que ostentam o poder do estado. No que concerne aos direitos económicos e sociais, o estado clinico é caótico, pois o país não tem conseguido prestar os serviços mínimos básicos à população, nomeadamente água, ensino, saúde, eletricidade, infraestruturas e salário digno.  A par destas constatações preocupantes, temos os casos das violações graves dos direitos humanos que decorrem da incúria  do estado face as praticas tradicionais nefastas que traduzem em atentados contra a dignidade da pessoa humana mormente, casamentos forçados, mutilação genital feminina etc.

Por conseguinte, não seria nenhum exagero afirmar que da nossa independência em 1973, para cá, foram 40 anos de atropelos à dignidade da pessoa humana, 40 anos de ultraje à memoria colectiva, 40 anos de intrigas, corrupção e de clientelismo político, 40 anos de denegação da justiça aos cidadãos, enfim, 40 anos de desestruturação das bases sobre as quais assentariam o estado guineense.

É curioso e triste recordar que os autores morais e materiais do golpe de estado de 12 de abril 2012, fundamentaram as suas ações ilegais com base neste quadro dramático, e, afirmaram de forma pomposa as suas intensões de proceder uma rotura definitiva com o passado, lançando bases para uma governação democrática que repousa nos mais sagrados princípios axiológicos do estado de direito. Foi tudo ao contrário,  o golpe fez regredir todos os indicadores ao nível dos direitos humanos até nos aspectos em que éramos considerados um dos bem posicionados ao nível da África, tais como a liberdade de imprensa e de expressão, para além de outras violações grosseiras que ocorreram ao longo deste fatídico período de transição que congregou um grupo de génios incompetentes ávidos ao enriquecimento fácil.

Para quem que conhece minimamente a Guiné-Bissau, constata facilmente que este país nunca foi objecto de uma verdadeira governação que satisfaz as aspirações do povo e o projeta no caminho do progresso e bem estar social. Os seus recursos foram sempre utilizados pelo proveito de um punhado de gente corrupta, obcecadas ao poder sem mínima preparação para o efeito. A nossa falta de seriedade associadas aos galopantes índices de corrupção no sistema judiciário e a enraizada cultura de impunidade, tornam a Guiné-Bissau um santuário de delinquência minando todos os esforços da comunidade internacional visando a consolidação da paz rumo ao desenvolvimento sustentado.

Perante tantas prevaricações,  violências, misérias e discriminações infundadas coloca-se a questão de saber, que fazer? Como fazer? Como agir no capitulo de promoção e respeito pelos direitos humanos? Sobretudo, quando as expectativas de ajudas publicas ao desenvolvimento são muito escassas devido as crises que afugentam as principais economias do ocidente, para não falar dos rigorosos critérios de acede-las.

Não podemos deixar de reconhecer, que a única contrapartida que a Guiné-Bissau pode oferecer e estimular os apoios dos seus principais parceiros de desenvolvimento nesta fase crucial, é ressaltar a importância dos direitos humanos.
Para isso, é nossa convicção que o poder político oriundo das recentes eleições gerais não dispõem de muita margem de manobra. A situação impõem que a vossa excelência elege a promoção dos direitos humanos como instrumento da política externa e de mobilização dos recursos financeiros os quais o país necessita urgentemente.

Por isso, lançamos um desafio ao novo Primeiro-ministro Eng. Domingos Simões Pereira, para romper as barreiras de conservadorismo no que concerne a composição orgânica do governo, e, criar por conseguinte, uma Secretaria de Estado dos Direitos Humanos. Isso não seria marketing político mas sim, uma medida genuína que visa transmitir uma forte mensagem à comunidade internacional sobre o compromisso das novas autoridades para com os valores do estado de direito. Aliás, a questão dos direitos humanos faz parte de um leque de preocupações com as quais a comunidade internacional pretende aferir a determinação das novas autoridades para proceder uma rotura definitiva com os males que afectam a Guiné-Bissau entre as quais as violações dos direitos humanos.

Esta eventual Secretaria de Estado dos Direitos Humanos, chamaria a si a coordenação política de todas as iniciativas públicas de promoção e defesa dos direitos humanos. De igual forma, os parceiros de desenvolvimento neste domínio, passariam a dispor de um interlocutor importante que ajudaria o país a cumprir as suas múltiplas obrigações internacionais decorrentes das convenções, protocolos e tratados assinados, nomeadamente a elaboração e execução do primeiro plano de ação pública de promoção e defesa dos direitos humanos na Guiné-Bissau.

Esta desejada estrutura governamental ajudaria também o executivo na formulação e concretização de politicas relativas à promoção e respeito pelos direitos humanos a luz dos principais instrumentos internacionais assinados e ratificados pelo país. De igual forma, seria-lhe incumbida a tarefa de efetuar estudos relativos ao aperfeiçoamento dos órgãos que intervém na realização da justiça, assegurando o respeito pela dignidade da pessoa humana e promover a cultura pelo respeito dos direitos humanos junto dos órgãos do estado e dos cidadãos.

Por fim, ela serviria uma ponte para a Guiné-Bissau definitivamente honrar os seus compromissos junto das Nações Unidas, da União Africana, este último através da sua Comissão de Direitos Humanos onde nunca participou na suas sessões semestrais muito menos apresentou um único relatório, depois de cerca de 30 anos de ter assinado a sua carta constitutiva.

Registamos com agrado a recente intervenção do Presidente JOMAV na cerimónia da sua investidura que a dada altura afirma citamos “ Reafirmo que serei o Presidente de todos os guineenses e que tudo farei para que os diferentes órgãos de soberania respeitem e façam respeitar o estado de direito democrático e de justiça social, baseado no pluralismo político e de expressão, no respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais de todos os cidadãos, independentemente de qualquer circunstância que os diferencie, assegurando igualdade de oportunidades” fim da citação.

Esta proclamação de fidelidade para com os valores do estado de direito feito pelo Presidente da República, deve traduzir em ações concretas ao nível do governo e da própria presidência da república, por forma a mostrar ao mundo que somos gente com dignidade e capacidade suficiente para fazer o melhor.

Os desejos de consolidação da paz e desenvolvimento sustentável dependem em grande medida do  compromisso sério com os direitos humanos, caso contrário, continuaremos afundar o país e trair a memória daqueles que hipotecaram as suas vidas em nome da nossa liberdade e bem estar.