9 de agosto de 2017

A PROPÓSITO DE DEPORTAÇÃO DAS CRIANÇAS TALIBÉS

Foi com profunda estranheza e de incomprensão que a LGDH registou as declarações do Primeiro-ministro, segundo as quais «todas as crianças que forem apanhadas a mendigar nas ruas de Bissau serão presas e deportadas para as ilhas». Estas infelizes declarações, para além de serem desajustadas para com as nobres funções do Primeiro-ministro, ignoram o verdadeiro drama social por que passam milhares de crianças, forçadas a deambular nas ruas de Bissau em nome da sobrevivência dos seus respectivos mestres.

A complexidade deste fenómeno brutal, que poe em causa os mais elementares direitos das crianças, ultrapassa meras medidas cosméticas e populistas as quais em nada contribuem para melhorar uma realidade social atentatória à vida e integridade física das vítimas.

Aliás, é curioso constatar que o Primeiro-ministro ao invez de anunciar medidas legislativas e operacionais adequadas, para sancionar aqueles que enviam as crianças nas ruas para mendigar, decreta ilegalmente a deportação daqueles que sofrem pela inacção do estado.
Como é do conhecimento público, a situação geral das crianças na Guiné-Bissau não pode ser dissociada das dificuldades conjunturais e estruturais que este país enfrenta a vários anos, agravada pela constante instabilidade política que afeta sobremaneira o seu tecido económico e social. Apesar do país dispor de instituições e organizações da sociedade civil que trabalham no domínio da defesa e proteção dos direitos das mesmas e de instrumentos jurídicos internos que consagram preceitos em prol das crianças, nomeadamente, a Constituição da República, o Código Penal, o Estatuto de Assistência Jurisdicional de Menores, existem fraquezas no capítulo das suas aplicaçoes e os mesmos carecem de harmonização com os instrumentos internacionais de defesa e proteção dos direitos das crianças. Com efeito, o sistema de proteção jurídica e social das crianças é deficitário em todas as suas vertentes, particularmente com a ineficácia dos tribunais especializados para dirimir os casos de crianças em conflito com a lei, para além das limitações de acesso aos serviços sociais básicos. A tudo isto se associam as indefinições e sobreposições das atribuições institucionais e uma inexistência de estratégias de coordenação no domínio da proteção das crianças.

Em consequência, os direitos à participação, desenvolvimento, proteção e sobrevivência, que assistem às crianças à luz da ordem jurídica nacional e do direito internacional, continuam ainda a ser um objetivo muito longe de se atingir.
A LGDH no quadro da sua missão de promoção e protecção dos direitos humanos tem publicado relatórios regulares sobre a situação dos direitos humanos na Guiné-Bissau com capitulos específicos sobre a situação da infancia no nosso país. Estes sucessivos relatórios, recomendam ao governo a premente necessidade de aprovação de uma lei contra a mendicidade forçada, criando assim uma base jurídica forte para a erradicação desta prática cultural violenta.

Infelizmente, os sucessivos governos sempre fizeram ouvido de mercador, e nunca colocaram este e outros assuntos de capital importância nas suas agendas prioritárias.