A Liga Guineense dos Direitos Humanos
tomou conhecimento, com enorme estupefação, do vergonhoso processo de revisão
pontual da Constituição da República desencadeado pelos deputados da Assembleia
Nacional Popular no dia 19 de Abril de 2018, visando a prorrogação da presente
legislatura até à realização das eleições legislativas, previstas para o dia 18
de Novembro do ano em curso.
A realização regular e periódica das
eleições para a renovação da legitimidade dos órgãos eletivos e dos respectivos
titulares e/ou membros, constitui um dos alicerces fundamentais da democracia
representativa, e, por esta via, traduz-se como um dos princípios estruturantes
do Estado de Direito.
A referida periodicidade deve ser
previsível, previamente determinada e com um elevado grau de estabilidade, não
devendo a sua concretização depender da vontade circunstancial dum grupo de
cidadãos representados no parlamento.
Aliás, o legislador constituinte
prevê no artigo 79º que “ cada legislatura tem a duração de 4 anos e
inicia-se com a proclamação dos resultados eleitorais”. Esta norma
constitucional vem desta forma estabelecer o principio de periodicidade do
mandato dos deputados e da própria legislatura. O sobredito preceito não é
passivel de revisão por força da alínea h) do artigo130° da CRGB, que estabelece
como um dos limites da revisão constitucional o sufrágio universal, direto, igual, secreto e periódico na designação dos titulares de cargos eletivos dos
órgãos de soberania.
Pelo seu grau de importância no
contexto democrático, a periodicidade dos mandatos foi elevada, na Constituição
da República da Guiné-Bissau em vigor, a categoria de limites materiais da
revisão constitucional, constituindo assim o núcleo duro da constituição. Com
efeito, a periodicidade da legislatura não pode ser alterada sem antes se rever
os limites materiais da constituição, sob pena de violação grosseira da Lei
Magna, pondo em causa, neste caso em concreto, o direito fundamental que assiste
ao povo de legitimar ou não, por via das novas eleições, a continuidade ou
permanencia dos seus representantes.
Para a
LGDH, esta iniciativa de revisão constitucional viola de forma flagrante a
letra e o espírito da Constituição, e, por conseguinte, representa uma ameaça ao Estado de Direio
porquanto abre ou poderá abrir um precedente grave na democracia guineense.
Esta
posição da organização é consentânea com o Acórdão Nº 4/2008, de 31 de Julho,
que declarou na altura inconstitucional uma tentativa semelhante levada a cabo
na sétima legislatura pela Assembleia Nacional Popular.
Com a
aprovação desta lei, o parlamento transmite a mensagem de que doravante
qualquer formação política ou grupo de partidos políticos podem por sua livre e
espontânea vontade, alterar a constituição e estipular novo período para o fim
da legislatura como forma de acomodar os seus interesses políticos inconfessos.
Dada à gravidade
desta em relação às conquistas democráticas, a LGDH apela a sua excelência o Sr.
Presidente da República, na sua qualidade de garante da constituição, para
vetar esta vergonhosa Lei de revisão constitucional por colidir frontalmente
com os valores e os princípios estruturantes da nossa lei magna.
Outrossim,
em caso da promulgação pelo Presidente da República desta lei manifestamente
inconstitucional, a LGDH exorta ao Ministério Público, na sua qualidade do
defensor da legalidade, para requerer a declaração da inconstitucionalidade da
mesma no Supremo Tribunal de Justiça, em salvaguarda dos direitos e das
aspirações do povo guineense.
Pela paz, justiça e direitos humanos
Feito em
Bissau, aos 19 dias do mês de Abril de 2018
A Direção
Nacional
___________________________