24 de agosto de 2016

O DIREITO À SAÚDE EM CRISE NA GUINÉ-BISSAU

O direito à saúde  é um direito inerente a dignidade da pessoa humana, implica a garantia de outros direitos sociais além do direito à utilização de serviços de saúde e é dependente de adequada articulação de politicas económicas e sociais. Ou seja, a saúde como direito humano social transcende o acesso aos serviços de saúde e depende de condições económicas e sociais para suprir as necessidades e permitir o alcance de uma vida digna, de condições para a assunção de modos de vida saudáveis, de educação entre outros.

O estado tem para o efeito, o papel estratégico na implementação de politicas que promovam a saúde pública de qualidade capaz de não só prevenir  as doenças mas também a adoção de medidas proactivas tendentes a garantia do acesso a cuidados de saúde com qualidade e eficiência.

A Guiné-Bissau, embora não dispõe de um verdadeiro Sistema Nacional de Saúde, em termos administrativos a divisão de saúde é composta por 11 regiões e 114 áreas sanitárias, estruturadas em três níveis: central, regional e local. Cada nível é composto por estruturas de gestão, de prestação de cuidados, de formação e de investigação.


As características comuns dos centros de saúde e estabelecimentos hospitalares são essencialmente a imagem de ruina das infraestruturas que os acolhem, o ambiente insalubre sem instalações adequadas para acolher os pacientes, (com forte probabilidade de contrair outras doenças tais como infeções hospitalares) a falta de ética e deontologia profissional por parte da esmagadora maioria dos técnicos, cobranças ilícitas pelos tratamentos e concessão de juntas médicas falsas a troco de montantes elevados de dinheiro.

A cobertura sanitária estima-se a 40% para um raio de cinco km. Esta situação é acentuada pelas condições precárias das vias de acesso e pela falta de meios de comunicação, em particular para as situações de urgência. Por isso, a maior parte dos utilizadores dos serviços de saúde, nomeadamente grávidas, parturientes e crianças, têm dificuldades de acesso geográfico.


A análise da situação sanitária da Guiné-Bissau apresenta algumas situações preocupantes, resultantes da fraca capacidade do sistema sanitário em responder às necessidades da população em matéria de saúde. Os factores que limitam essa resposta são: limitação do orçamento destinado ao sector de saúde 13,3% (OGE 2015), comportamento irresponsável de alguns intervenientes, baixo nível de alfabetização, insalubridade do meio ambiente, pobreza da população e instabilidade política e institucional.
O paludismo, o VIH/SIDA, a Tuberculose, as doenças diarreicas, as infeções respiratórias agudas, as doenças potencialmente epidémicas, como a cólera, constituem graves problemas de saúde pública.

As doenças não transmissíveis, como as diabetes, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares, perturbações mentais, má nutrição e doenças oncológicas são cada vez mais notórias nos registos dos estabelecimentos de saúde sem qualquer capacidade técnica de resposta adequada.

Os problemas ligados à capacidade de resposta do sistema de saúde incluem a insuficiência dos recursos humanos (quantidade e qualidade), a situação precária das infraestruturas e desgaste dos equipamentos devido à falta de manutenção adequada, a repartição desigual dos recursos disponíveis e insuficiência dos recursos financeiros destinados ao sector de saúde, e à ausência de regulamentação com um manual de procedimentos.

Constata-se ainda uma gestão inadequada do sector de saúde devido a sinais evidentes de clientelismos e corrupção, acompanhada por um Sistema Nacional de Informação Sanitárias deficiente e uma coordenação insatisfatória das intervenções do conjunto dos parceiros.

No quadro do projeto Observatório dos Direitos da LGDH, foram recolhidos dados estatísticos em vários sectores temáticos entre as quais o sistema de saúde guineense.

Os referidos indicadores de saúde tais como a distância entre local de habitação onde exista consulta pré-natal, custo da primeira consulta pré-natal (cartão, analise e consulta), custo de 5 medicamentos ( para paludismo, febre, diarreias, dores e hidratação infantil, pessoal de saúde por hospitais, centros ou unidades de base por região (médicos, enfermagem, parteira, auxiliar de saúde e agentes de saúde, evidenciam enormes constrangimentos do sector e seu consequente disfuncionamento.

A titulo de exemplo, a Guiné-Bissau regista neste momento uma enorme disparidade entre o número de médicos por habitantes em diferentes regiões do país onde a região de Gabú aparece no topo da lista com 30.790 habitantes por médico, seguida da região de Biombo com 24.280 habitantes por médicos. De igual forma as regiões de Oio, Tombali, Quinara e Cacheu apresentam indicadores preocupantes de habitantes por médicos.

Estes indicadores de médicos por habitantes contrastam de forma galopante e vergonhoso com as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), esta organização que monitoriza a situação sanitária ao nível global, preconiza como parâmetro ideal de atenção à saúde da população, a relação de 1 médico para cada 1.000  habitantes. Na Guiné-Bissau o numero mais baixo de habitantes por médico em 8 regiões administrativas são 3.684 pessoas por médico na região de Bafata devido aos inúmeros apoios de diferentes projetos de desenvolvimento sanitário com especial destaque para a PLAN International, Médicos Sem Fronteiras entre outros.

Num contexto de incompetência, associada a crónica instabilidade governativa e de ausência de estratégias para o desenvolvimento do sector de saúde, os desafios para o precário sistema de saúde guineense são inúmeros mas as prioridades das prioridades se resumem na  melhoraria da governação do sistema de sector, adoção de quadro legal moderno com destaque para a lei de base de saúde, recrutamento criterioso de recursos humanos qualificados de uma forma adequada à realidade nacional, dando uma atenção particular à motivação dos mesmos, redução da morbilidade e mortalidade materno infantil, aquisição de equipamentos laboratoriais modernos e melhoria das infraestruturas sanitárias, inverter a tendência da prevalência das doenças sexualmente transmissíveis entre outros. 

Um país com um sistema de saúde doente e ineficaz é um país sem futuro, quando é assim a paz e o progresso ficam como meros sonhos longe de se concretizarem.

Chegou a hora de dizer basta á corrupção, basta a clientelismo, basta a incompetência, basta a nepotismo, e dar prioridades ao fornecimento de serviços básicos à população tais como direito á saúde.